Lutero e o Fim dos Tempos
Neste ano, a Alemanha celebra os 500 anos da Reforma. Ela começou em 1517, quando um certo professor de Bíblia e monge publicou em Wittenberg, na Saxônia, 95 teses contra mazelas católicas romanas. Consideradas friamente, essas teses ainda não eram particularmente revolucionárias, mas mesmo assim a época revelou-se suficientemente madura para transformar aquela centelha num incêndio de grande porte. O tal monge é hoje mundialmente famoso: Martinho Lutero. Neste assim chamado “ano de Lutero” lembramo-nos de como ele extraiu do nada uma alternativa evangélica à igreja católica romana. Conforme alguns dizem, ele sinalizou com isso o fim da Idade Média e o início da Idade Moderna.
Isso, porém, não correspondia necessariamente às intenções de Lutero. O reformador nunca se considerou pioneiro de uma nova época, mas um proclamador dos dias finais segundo o modelo de Noé. Quando Lutero fez suas descobertas “evangélicas”, ele não pretendia fundar uma nova igreja, mas obter a necessária reforma da igreja existente na iminência da irrupção do “juízo final”, antes do fim do mundo antigo.
No início da Reforma, Lutero escreveu a um amigo: “Tenho a convicção de que o último dia está às portas”. Vinte anos mais tarde ele ainda reafirmava isso: “É a última hora”. Ele cria que Jesus Cristo voltaria logo para julgar a antiga criação e para trazer um novo mundo celestial. Assim, por exemplo, ele se casou com a freira Catarina de Bora para estabelecer um sinal, ainda que na sua opinião o “tempo era breve” até que se manifestasse o “justo juiz” Jesus Cristo.
Martinho Lutero cria que a maioria das profecias sobre os tempos finais que Jesus Cristo e os apóstolos haviam anunciado se cumpriram nos dias dele e que por isso o fim estava próximo. Já no estágio inicial da sua reforma, Lutero se convencera “de que o papado era a sede do verdadeiro e encarnado Anticristo”, porque o papa queria “ter Deus e sua Palavra submissos a ele, com ele assentado por cima”. No entanto, Lutero não chamou nominalmente algum determinado papa de anticristo. Para ele, o Anticristo era um “conceito coletivo”, uma “instituição” que “falsifica a verdade de Cristo”, conforme explica o biógrafo de Lutero Robert Bainton. Por isso Lutero podia dizer que “nestes últimos tempos”, o Diabo já “vem fortalecendo o Anticristo e o reino anticristão há alguns séculos”. Lutero entendia que o trono papal já se tornara anticristão mais de 400 anos antes (do tempo dele), que o Diabo fora solto e que a última época das perseguições dos tempos finais havia começado.
Lutero viu como confirmação dessa ideia a reação às suas teses reformatórias elaborada pelo importante teólogo romano Silvestro da Prierio. Segundo o historiador eclesiástico Heiko Oberman, Prierio afirmava sem rodeios que o papa não conhecia nenhum juiz acima dele e que por isso não poderia ser deposto quando conduzisse, junto com ele, “as multidões dos povos ao Diabo no inferno”.
Martinho Lutero enxergava o mundo cheio “de exemplos da ira e do juízo de Deus”. Segundo ele, a humanidade estava madura para o juízo final. Lutero considerava a si mesmo um pregador do arrependimento nos tempos finais, como Noé. Embora não se considerasse no mesmo nível que Noé, ele e seus pregadores evangélicos conclamavam os papistas, nobres, burgueses e camponeses ao arrependimento e à conversão a Deus, tal como Noé fizera nos tempos antigos – “porque o Dia do Senhor estava às portas”. Aos olhos do reformador alemão, o apocalipse era iminente. segue no próximo bloco.
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